5 de janeiro de 2007

Ciranda

Inconscientemente eu aspiro esse aroma psicotrópico do dia em que deixei de sofrer. Anestesiado só enxergo à frente, numa alucinação digna do ópio, mas consistente como as letras. Sei que não poderei viver desse “barato”, e que toda noite terei momentos da caretice reacionária, mas esse ópio da paz é bom para esquecer. Esquecer para lembrar. Lembrar para continuar. Continuar porque estou vivo e quem vive não pode parar. Lúcidos ou chapados todos temos que continuar. E quando chegar à total lucidez procurarei de novo sentimentos lisérgicos, pois adoro ver o mundo à rodar. Uma ciranda lunática na beira do mar, cantando para amar, dançando para Iemanjá.

4 de janeiro de 2007

Negro (ou mel de boddah)

As negras esferas rolam

Desviam-se pra longe

Fogem?

Em meio ao mar negro

Com ondas sinuosas

Esferas de mel se perdem

Procurando as negras

Que perdem o brilho

Rolam incessantes

Para todos os lados

Mas não buscam o mel

Fogem?

Perdem-se?

No brilho dos dentes serrados

O mel se derrama

Encontrem-se

Tornem-se

Novamente

O negro mel

O doce mel negro

3 de janeiro de 2007

Inferno

Bem que disseram que era aqui

Demônios sempre rondam

Mentiras, verdades

Enxergo nos olhos

Espero que enxergue no meu

O que tenho não é ódio

Não combina o inferno

Deixe-me ir

Liberte nossas almas

Podemos achar o céu

Mas meu céu não é esse inferno

Não mereço arder

Esse fogo não precisa cuspir

Nem em mim, nem em você

Preciso voar

Sem seu peso em minhas asas

O fim não precisa ser aqui

Pode ser o começo

Pode ser o lado bom

Do lado ruim

Esse fogo não precisa cuspir

Não precisa queimar

Não irá arder

Basta querer

2 de janeiro de 2007

Estrada

Hoje saio com os primeiros raios de sol, assim espero, ou com as primeiras gotas de chuva. Sinto-me meio como aquele poeta, do qual gosto tanto. Guardadas as devidas proporções, entendo hoje toda sua falta de rumo, e se não tenho toda aquela coragem pintada em azul e branco, tenho a mancha vermelha viva que pulsa no meio do peito. No pulsar do pistão do motor da única coisa que me restou vejo a euforia da solidão, olho para o caos da construção onde estou e percebo o vazio habitado por saudades, esperança, uma barata e algumas formigas. A fumaça e o atrito das rodas deve deixar pra trás tudo que não quero lembrar, e o que não quero pensar. No ciclo da circunferência de 22 polegadas deve ficar também as horas e minutos que restam dessa marcação mundana chamada ano. Depois disso, voltar. O poeta de qual falei parece nunca pensar nesse voltar, talvez seja essa nossa diferença. Nossa igualdade está na penetrante vontade de ir. Sem rumo, ou com objetivos camuflados em uma aparente falta de lucidez. Beberei daqui a algum tempo a um novo ano, beberei a esse poeta, beberei também aos outros que são ou não poetas, beberei a volta. No último gole do etílico, que beberei entre a fusão do novo e do velho tempo, beberei procurando respostas. Após, curado o corpo do choque temporal, novamente sobre os aros e estruturas móveis de metal, de volta a doce e empoeirada estrada, virei rápido buscar a paz azul e branca que os versos do poeta prometeram ao meu pulsar vermelho.

Santa trindade

Boddah senta feliz

Perde-se nos cabelos

Cabelos longos e negros

Belos Cabelos

Brilhosos e intensos

Cabelos de mãe d’água

Sinto falta de Boddah

Voltarei a vê-lo

Deixei que fosse

Agora tenho medo

Espero que Boddah volte

Ainda montando os cabelos

Compridos e negros

Belos e verdadeiros

Cabelos de mãe d’água

Sereia inexistente

Perdida em meus devaneios

Eu, a sereia e Boddah

Idealizador, criador e criatura

Sem uma ordem real

Apenas espero que voltem

Todos os três

Uma nova e santa trindade

Carmem 10114919

Cinco minutos para um novo ano. Sento aqui com um cara foda, só nós dois, como sempre preferimos nos isolar do mundo. Falamos de tudo q aconteceu nos últimos trezentos e muitos dias, conto tudo, tudo que estou sentindo, ele faz o mesmo. Não comentamos nada, apenas escutamos um ao outro. Esse silêncio nos diz como estamos, vazios, esperando que um novo mundo nasça. Ambos esperamos por Carmem, cada um a sua doce e, ainda, inexistente, Carmem. Onde está Carmem? Leio novamente Cuenca e por mais que procure nas teclas do PC, nos números do celular, não consigo achar Carmem. Onde está Carmem? Preciso de Carmem.